13 de Setembro, 2022 Artigos

Desvendando Mitos Parte 3.2 - Estudos Sérios - Estudos Questionáveis e Energia Solar

Acesse a primeira parte do artigo pelo link: https://bit.ly/primeiraparteartigo


O item 5.1.4 afirma que o mais relevante na análise das eficiências de conversão que foram tabeladas é o fato de que “a ineficiência do MLPE de telhado tem uma relação direta com a longevidade do produto”. Porém não existe qualquer dado ou referência bibliográfica de longevidade até aqui neste “estudo”. Mesmo que tivesse sido apresentado algum dado, a eficiência de conversão de um inversor fotovoltaico está relacionada apenas com a potência de entrada e a potência de saída do equipamento, conforme a equação de eficiência percentual a seguir:


Tentem imaginar o semblante do revisor a esta altura da revisão do trabalho. Para completar, ainda afirma que não se espera que a longevidade de um inversor localizado dentro de um edifício seja comprometida devido ao calor externo. Na verdade, todo inversor fotovoltaico possui uma função de gerenciamento térmico, então não se espera de nenhum inversor fotovoltaico que o calor externo comprometa sua longevidade.


  1. Item 6.1.3

Este item faz uma comparação sobre as temperaturas de operação dos microinversores e otimizadores. Novamente encontramos informações erradas sobre os microinversores APsystems. Neste item é informado que os microinversores Enphase podem suportar até 65 °C de temperatura ambiente e 85 °C de temperatura interna de operação e que os microinversores APsystems suportam uma temperatura máxima de operação de 65 °C. Contudo, os microinversores APsystems podem suportar até 65 °C de temperatura ambiente. Sobre a temperatura interna de operação, até a publicação deste artigo não existia qualquer folha de dados técnicos ou manual afirmando que os microinversores Enphase podem suportar até 85 °C de temperatura interna de operação. Por outro lado, é possível encontrar nas folhas de dados de ambos os fabricantes a informação da faixa de temperatura de armazenamento, a qual pode variar de -40 até 85 °C. Um erro grosseiro que invalida praticamente todo o “estudo” no que diz respeito à análise térmica, visto que essa informação é usada sempre como uma premissa.


Felizmente temos um bom material de leitura falando sobre o derating de temperatura dos inversores fotovoltaicos, o qual apresenta gráficos com dados reais de monitoramento, os valores de faixa de temperatura dos microinversores APsystems e de outros equipamentos.


  1. Item 6.1.6 até o Item 6.1.14

O item 6.1.6 afirma que foram analisadas 4 instalações de microinversores APsystems no Brasil e uma instalação de SolarEdge, de modo a comparar seu desempenho real e o estimado. Vamos nos colocar no papel de um revisor e fazer alguns questionamentos:


  1. Qual o critério de seleção das instalações? O mesmo critério foi adotado para todas?

  2. Por que foram escolhidos 4 sistemas APsystems, 1 sistema SolarEdge e zero sistemas da Enphase?

  3. Quais foram os parâmetros de simulação inseridos como dados de entrada na simulação no PVsyst?

  4. Quais foram os modelos e quantidades de microinversores, otimizadores, módulos e seus respectivos dados técnicos?

  5. Qual a configuração do layout dos sistemas em campo e na simulação?

  6. Onde é possível obter os dados brutos do estudo?

  7. Qual o tempo de duração do teste e da simulação? Qual o período do ano do teste e qual o período considerado na simulação?

  8. Qual o tipo de estrutura de fixação dos módulos? Por exemplo, se a instalação for em um telhado, qual o tipo de telhado? Qual o distanciamento entre módulos e o telhado? Qual o distanciamento dos microinversores para o telhado e para os módulos?

  9. Quais as referências bibliográficas sustentam a afirmação de que uma margem de erro da ordem de 4 a 5% anualmente é aceitável?

  10. Se não há registros de dados reais de irradiância para esse período, como validar que a margem de erro está correta? Qual período se refere o autor?

  11. Em qual ponto foi medida a temperatura ambiente?

  12. Por que não existe sequer 1 foto dos sistemas FV apresentados no estudo? Como comprovar a real existência de tais sistemas?

  13. Quais as condições de qualidade da rede em cada um dos sistemas analisados?

  14. Algum dos sistemas apresentam erros em seu log de erros que porventura possam prejudicar as análises?

  15. Os módulos fotovoltaicos estavam em plenas condições operacionais?

  16. As instalações estavam dentro das normas aplicáveis e seguindo os manuais de instalação dos equipamentos?


É notória a falta de informações cruciais para validar este “estudo”. Poderíamos fazer muito mais questionamentos, pois estes são aqueles relacionados apenas à montagem do experimento. Vamos agora à alguns fatos:


  1. Os sistemas foram escolhidos a dedo;

  2. Estas amostras não têm significância estatística suficiente para extrapolar todo o mercado;

  3. Foco no mercado brasileiro, mas foram feitos testes em um equipamento que não é comercializado no mercado brasileiro;

  4. Existem informações e suposições erradas, por exemplo, ao afirmar que “suspeita-se” que o microinversor da APsystems limite sua produção a temperaturas consideravelmente menores que 65 °C;

  5. Gráfico com valores embaçados, impossibilitando avaliar as grandezas elétricas apresentadas, muito menos se o gráfico realmente pertence à algum dos sistemas ou se corresponde a algum dia dentro do período de estudo;

  6. Um dos sistemas apresenta uma diferença de 24,7% por cento entre a geração real e a estimada. É inconcebível que um sistema gerando 1/4 a menos do que o estimado não esteja apresentando algum tipo de problema ou a simulação esteja incorreta. O mesmo também pode-se dizer de um sistema que apresenta uma diferença de 14,4% por cento entre a geração real e a estimada;

  7. Não foram feitas medições de temperatura ou irradiância nos locais das instalações para confrontar com os dados de geração;


Outro objetivo importante da revisão por pares é certificar-se de que os manuscritos publicados no periódico têm qualidade compatível com os objetivos do mesmo [5]. Entretanto, não existe uma relação causal entre o que está sendo verificado e o que está sendo concluído. A irradiância solar deve ser quantificada para cálculos de desempenho energético, sejam eles cálculos de geração futura esperada ou para avaliação de geração passada [6]. O estado da arte na prática da previsão de geração de um sistema FV envolve basicamente três passos: avaliação das condições climáticas no local, modelagem do desempenho FV e estimativa de mudanças de longo prazo no desempenho do sistema FV durante o período de previsão [7].


Portanto, além de conter informações e conclusões erradas, a metodologia adotada (se é que houve algum método empregado no experimento) não comprovaria a veracidade das afirmações feitas. Sequer houve alguma avaliação das condições climáticas no local.


  1. Item 7 – Testes de desempenho em laboratório

No item 7.1 afirma-se que foram realizados testes térmicos, de qualidade de energia e de conversão de energia.


É importante registrar que o microinversor APsystems utilizado foi o DS3-L de 768 W, o qual não é vendido no Brasil. Apesar do nome parecido, os modelos vendidos no Brasil são o DS3D de 2000 W e o DS3D-L de 1600 W, os quais não fizeram parte deste “estudo”.


No item 7.2.1 afirma-se que os microinversores da APsystems e Enphase receberam uma tensão de entrada de 36 V e uma corrente de entrada de modo que a geração na saída fosse equivalente a 90% da saída de pico.


No item 7.3.7 afirma-se que não foi possível realizar um teste térmico nos otimizadores por falta de infraestrutura laboratorial (não possui 6 fontes de alimentação). Contudo, sem que fosse realizado qualquer teste ou citado o modelo de otimizador que seria utilizado, o autor se antecipa ao afirmar que é razoável assumir que o aumento de temperatura seja menor que os microinversores. Qual o objetivo do estudo mesmo?


Antes de partir para os resultados dos testes térmicos, convém já deixar registrado que a metodologia novamente está errada. Isto porque o APsystems DS3-L e o Enphase IQ 7 são equipamentos de potências completamente diferentes. Sim, agora o autor está trabalhando com o IQ 7 e não mais com o IQ 7+. Enquanto o primeiro é um equipamento de 768 W, o segundo é um equipamento de 240 W, ou seja, o APsystems possui 3,2 vezes mais potência. É óbvio que um equipamento que faz a conversão de 3,2 vezes mais energia irá aquecer mais. O desafio seria montar um experimento e elaborar um método para que o efeito térmico fosse equivalente em ambos os equipamentos – o que não foi feito.


Os resultados do teste feito mostraram o aquecimento maior do DS3-L e 3 supostos desligamentos por temperatura. São supostos desligamentos porque não é possível verificar se os desligamentos foram causados pela temperatura. Além disso, existem 3 pontos a serem citados que tornam os resultados questionáveis:


  • A temperatura interna para que o DS3-L ative o seu sistema de derating é superior a 65 °C;

  • O DS3-L não desligaria, como foi afirmado, e sim, reduziria sua potência;

  • A temperatura ambiente dos 2 microinversores é diferente, o que mostra que o experimento não está sendo conduzido de forma igual nos 2 casos e/ou existe erro de metodologia.


Além disso, os parâmetros de temperatura para acionamento do sistema de gerenciamento térmico dos microinversores APsystems podem ser alterados por um operador. Esta parametrização não foi apresentada.


Além disso, o DS3-L está sendo testado sobre uma mesa e esta condição de operação não é permitida no manual do equipamento. Devem ser atendidos todos os requisitos de espaçamento prescritos pelo fabricante, sob pena de perda de garantia.


Sobre a medição da distorção harmônica total, conforme a Portaria INMETRO 140/2022 [8], estes ensaios devem ser realizados em laboratório de terceira parte, nacional ou estrangeiro, acreditado pelo INMETRO/CGCRE ou por organismo de acreditação signatário de acordo de reconhecimento mútuo do IAAC ou ILAC, ou em laboratório designado pelo INMETRO. Além de garantir que os testes não sofram interferências de espúrios provenientes da própria rede ao qual o equipamento está conectado, existe uma metodologia especifica para o Brasil. As normas ABNT NBR 16149 [9] e ABNT NBR 16150 [10] foram elaboradas e publicadas considerando justamente as particularidades do sistema elétrico brasileiro. Por exemplo, este tipo de ensaio requer um simulador de rede, o que não foi providenciado e evidencia amadorismo na condução dos testes. Portanto, quaisquer resultados para este tipo de teste não possuem validade.


Sobre a faixa de operação do MPPT, os microinversores DS3-L com números de série de 703000069463 a 703000084462 são caracterizados por uma faixa de tensão de MPP começando em 34 V, ou seja, para serem utilizados em módulos de alta potência, assim como no Brasil. Ademais, no Brasil cada canal de entrada do DS3D e DS3D-L opera em uma faixa de 64 a 110V, ou seja, para 2 módulos de alta potência por canal, tornando inútil este tipo de teste para exemplificar o cenário brasileiro. Contudo, outro fato chama a atenção: para o sistema SolarEdge o autor apresentou os resultados de laboratório – procedimento completamente diferente do adotado nos outros sistemas. Por que não apresentar os resultados laboratoriais de todos e ter uma segunda base de comparação?


Conclusão

Podemos concluir então, com este artigo, que documentos muito bem formatados estão sendo produzidos e divulgados no mercado de energia solar e estão induzindo tanto distribuidores e revendedores, quanto o consumidor final, ao erro. 

Alguns desses documentos com erros graves, informações erradas e métodos que conduzem a resultados não verdadeiros. Além disso, para a produção desses documentos, pessoas utilizam referências bibliográficas em inglês, com afirmações que não existem no documento original, induzindo, mais uma vez, o leitor ao erro, acreditando em fatos que não são verídicos. 

A intenção desse artigo é mostrar, com base em provas, documentos originais e referências bibliográficas, como distinguir uma desinformação, de um conteúdo com credibilidade, principalmente voltado à tecnologia MLPE, da qual a Ecori é líder e pioneira no mercado brasileiro, primando sempre pela segurança de todos os envolvidos no mercado. 

Esperamos que as empresas que elaboram projetos, executam instalações e, principalmente o consumidor final, possam escolher produtos e serviços baseados em uma boa conduta moral, boa-fé e honestidade comercial.

Diminuir uma empresa, produtos e/ou serviços de concorrentes não faz e nunca fez parte do DNA da Ecori. Primamos por exaltar a qualidade dos nossos fornecedores e parceiros, desde o primeiro momento de nossas escolhas, ao invés de depreciar nossos concorrentes. Em uma concorrência saudável todos nós ganhamos!

Deixamos o questionamento para o leitor: será que depois dessa análise crítica que fizemos desses 2 estudos, podemos dizer que desvendamos algum mito ou poderíamos considerar como casos de campanha de difamação?


Referências

  1. Maria Clotilde Pires Bastos, Daniela Vitor Ferreira, “Metodologia Científica”, Editora e Distribuidora Educacional S.A., Londrina, 2016.

  2. ELSEVIER, “What is peer review?”, Elsevier, 2022. Disponível em https://www.elsevier.com/pt-br/reviewers/what-is-peer-review. Acesso em: 31 Ago. 2022.

  3. Wulf-Toke Franke, “The Impact of Optimizers for PV-Modules - A Comparative Study”, Universtity of Southern Denmark, 2019.

  4. James Hoare, “Micro Inverter & PV Optimser Performance - Technical Review”, LHW Partnership LLP, 2022.

  5. SPRINGER, “Processo de revisão por pares”, Springer, 2022. Disponível em https://www.springer.com/br/authors-editors/authorandreviewertutorials/submitting-to-a-journal-and-peer-review/peer-review-process/12011818. Acesso em: 31 Ago. 2022.

  6. Reise C., Müller B., Moser D., Belluardo G., Ingenhoven P., “Uncertainties in PV System Yield Predictions and Assessments”, 2018. https://doi.org/10.1089/10445490260099773.

  7. B. Meng, R.C.G.M. Loonen, J.L.M. Hensen, “Performance variability and implications for yield prediction of rooftop PV systems – Analysis of 246 identical systems”, Applied Energy, Volume 322, 2022, 119550, ISSN 0306-2619, https://doi.org/10.1016/j.apenergy.2022.119550.

  8. INMETRO, Portaria Nº 140, de 21 de março de 2022. Disponível em https://in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-n-140-de-21-de-marco-de-2022-389587680, Acesso em: 31 Ago. 2022.

  9. Associação Brasileira de Normas Técnicas, Norma Brasileira ABNT NBR 16149:2013 – Sistemas fotovoltaicos (FV) – Características da interface de conexão com a rede elétrica de distribuição, 2013.

  10. Associação Brasileira de Normas Técnicas, Norma Brasileira ABNT NBR 16150:2013 – Sistemas fotovoltaicos (FV) – Características da interface de conexão com a rede elétrica de distribuição – Procedimento de ensaio de conformidade, 2013.

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