17 de Janeiro, 2023 Artigos

Como escapar das mudanças da Lei 14.300

Como muitos já devem saber, já estão valendo as novas regras para valoração dos créditos de energia dos consumidores que participam do Sistema de Compensação de Energia Elétrica (SCEE). Contudo, você sabia que, mesmo que este prazo tenha se esgotado, ainda é possível ter um sistema de micro ou minigeração capaz de operar conectado à rede elétrica sem que o consumidor sinta no bolso as mudanças promovidas pela Lei 14.300 [1]? Isto mesmo, usufruindo das mesmas vantagens que um consumidor que, por exemplo, instalou seu sistema em 2022.


Muitos já devem estar respondendo. Basta instalar um sistema de armazenamento com baterias. Bem, não basta instalar apenas um sistema de armazenamento com baterias. Esta é uma opção, mas que ainda precisa ser complementada com uma outra função que nem todo fabricante de inversor disponibiliza. Falaremos sobre isso mais à frente.


Mas se dissermos que também é possível escapar da taxação mesmo sem um sistema de armazenamento com baterias? Quer saber como? Neste artigo vamos explicar como instalar um sistema fotovoltaico escapando da famigerada taxação, com ou sem um sistema de armazenamento. Este artigo tratará somente do custo de distribuição, também chamado de Fio B e especificamente à geração distribuída utilizando sistemas fotovoltaicos.


Introdução


Primeiramente precisamos esclarecer algumas coisas para evitar dúvidas que certamente surgiriam no decorrer da leitura. Vamos lá:


A Lei 14.300 estabeleceu muitas mudanças, uma das mais importantes, provavelmente a mais importante, é a cobrança de uma taxa sobre a energia elétrica injetada na rede e posteriormente compensada pelos consumidores com geração distribuída.


Observe que sublinhei o termo “injetada na rede” porque a taxação não incide sobre o autoconsumo local. O autoconsumo local é aquela parcela de energia que foi gerada, mas que foi consumida imediatamente na própria unidade consumidora onde essa energia foi gerada.


Imagine uma casa com um sistema fotovoltaico que exatamente ao meio-dia está gerando 80 kWh, mas existe uma geladeira e um ar-condicionado ligados e que estão consumindo 10 kWh neste mesmo momento. Então, esses 10 kWh estarão sendo supridos pela geração fotovoltaica e o restante, 70 kWh, estará sendo injetado na rede elétrica, naquele instante. Portanto, temos um autoconsumo de 10 kWh e uma energia injetada de 70 kWh. 


Neste exemplo, temos um retrato de momento. Apenas no final do mês a distribuidora de energia vai olhar no medidor bidirecional e contabilizar o acumulado de energia injetada no mês. O que foi consumido imediatamente no local não é registrado no medidor, portanto, não poderá ser taxado.


Então, a primeira conclusão que temos é que um consumidor que não injeta energia na rede não será taxado.


Observe também que sublinhei a expressão “posteriormente compensada”, porque mesmo que seja injetada energia rede, o pagamento da “taxa” aconteceria sobre a energia injetada apenas no momento em que ela for compensada.


Desta forma, a segunda conclusão que temos é que se a compensação de créditos de energia não ocorrer, a taxação não poderá ser efetivada.


Por fim, também sublinhei a expressão “consumidores com geração distribuída”. Isto porque um consumidor pode ter um sistema fotovoltaico instalado e não necessariamente ser um consumidor com geração distribuída participando do SCEE. Um exemplo disso é um consumidor com um sistema fotovoltaico homologado na distribuidora de energia como autoprodutor.


Enfim, a terceira conclusão que temos é que um consumidor que não participa do SCEE não será taxado.


Obviamente quem não participa do SCEE não tem créditos de energia quando injeta energia na rede, então quando ele eventualmente injeta energia na rede, essa energia não se transforma em créditos e acaba sendo “doada” para a rede elétrica. Porém, como vimos em um artigo anterior, para quem não quer “doar” energia para a distribuidora é possível limitar a injeção de energia na rede através da função Zero Export.


A taxação


A Lei 14.300 apresenta os valores percentuais a serem utilizados na aplicação da regra de transição disposta nos artigos 26 e 27 da Lei 14.300, associada ao faturamento da energia compensada no âmbito do Sistema de Compensação de Energia Elétrica. A Figura 1 resume as regras definidas em Lei para esses subgrupos:



Fig. 1 – Percentual dos custos de distribuição ao longo do período de transição.


Portanto, para quem homologar um sistema FV a partir de agora, estará submetido à uma regra de transição, onde a cada ano o percentual de taxação irá aumentar até atingir 100% dos custos de distribuição. A vantagem adquirida por quem homologou seu sistema FV antes da nova regra é que essa regra de transição não se aplica até 31 de dezembro de 2045. Depois de 2045, até mesmo as unidades consumidoras com micro ou minigeração distribuída homologadas antes das novas regras estarão sujeitas às regras tarifárias estabelecidas pela ANEEL.


Então as unidades consumidoras que começarem a participar do SCEE a partir de 2023 irão ser taxadas sempre em 15%, as que começarem a participar a partir de 2024 irão ser taxadas sempre em 30% e assim sucessivamente? Não! Estas unidades irão pagar um percentual maior a cada ano, o qual será gradual, até que em 2029 estes custos de distribuição serão cobrados em 100% de seu valor.


A única exceção é para as unidades que protocolarem solicitação de acesso na distribuidora entre o 13º (décimo terceiro) e o 18º (décimo oitavo) mês contados da data de publicação da Lei 14.300, ou seja, entre 08 de janeiro e 07 de julho de 2023. Essas unidades pagarão 90% dos custos de distribuição de 2028 até 2030 e em 2031 pagarão 100% destes custos.


Se não injeto não sou taxado


Perceberam que a taxação prevista só se aplica à energia injetada e posteriormente compensada pelas unidades participantes do SCEE com micro ou minigeração distribuída? Então, se a unidade não injetar energia na rede não existe energia para ser taxada. É exatamente este o ponto que vamos explorar: limitação da injeção de energia na rede.


Em alguns países onde a geração de energia elétrica a partir de sistemas FV se iniciou há mais de uma década, também ocorreram movimentos por parte das distribuidoras de energia no sentido de limitar a injeção de energia na rede ou serem remuneradas pelo uso da rede. Esses países implementaram suas regras para limitar a injeção de energia ou remunerar as distribuidoras, por conseguinte, os fabricantes de sistemas FV desenvolveram suas soluções e estratégias para que os consumidores pudessem mitigar os impactos dessas regras.


Existe mais de uma estratégia para isso, mas basicamente, o objetivo é um só: não injetar energia na rede elétrica.


Uma das soluções disponíveis no mercado é instalar um sistema de armazenamento de energia elétrica, que são geralmente baterias. O princípio de funcionamento é semelhante à função Zero Export, portanto, devemos considerar as seguintes premissas:


  1. O inversor FV é um inversor on-grid ou um inversor com bateria de backup operando no modo on-grid;

  2. O inversor FV deve ser capaz de controlar a quantidade de energia que ele deve gerar;

  3. O inversor FV deve receber a informação de quanta energia está sendo consumida naquele exato momento e a carga atual da bateria. Essa informação será usada para ajustar a quantidade de energia que deve ser fornecida naquele momento, seja através da fonte solar ou através da bateria.


A Figura 2 apresenta um sistema fotovoltaico conectado à rede elétrica com implementação de estratégia de controle de exportação de energia elétrica para a rede elétrica. Se o objetivo da estratégia de controle é não injetar energia na rede, ou seja, injeção zero, é mandatório que o inversor fotovoltaico gere apenas a quantidade de energia para o autoconsumo.


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Figura 2 – Exemplo de ligação física da ECU-C para executar as funções de medidor inteligente e Zero Export. Fonte: APsystems.


A vantagem de ter uma bateria (ou um banco de baterias) integrada ao sistema fotovoltaico é que um eventual excedente de energia agora pode ser enviado para a bateria para ser utilizado posteriormente e não somente para a rede elétrica. Então, antes de limitar a geração do inversor, o sistema FV pode verificar a disponibilidade de armazenar esse excedente de energia na bateria. E se não existe injeção de energia na rede, não haverá taxação.


A desvantagem dessa solução é o custo das baterias. Porém, é importante sempre colocar na ponta do lápis o custo da solução e o seu retorno tanto financeiro quanto em termos de qualidade de vida. Isto porque a energia armazenada durante o dia pode ser utilizada tanto durante a noite quanto durante um apagão.


Então, a primeira dica de solução é: usar um sistema com armazenamento. Agora a pergunta que não quer calar: como fugir da taxação com um sistema FV conectado à rede elétrica, mas sem um armazenamento de energia?


Para quem ainda não tem condições de inserir uma bateria no seu sistema FV, existe uma segunda solução, que é limitar a injeção de energia na rede e/ou otimizar o autoconsumo. Vamos explicar:


Já pararam para pensar que existem casos onde um sistema FV pode nunca gerar créditos? Isso acontece quando toda a energia gerada sempre é consumida instantaneamente. É muito comum isso acontecer em indústrias e comércios, por exemplo. Unidades consumidoras que nunca possuem energia elétrica gerada pelo sistema FV “sobrando” também nunca serão afetados pela taxação. Portanto, a segunda dica de solução é: se possível, dimensionar um sistema que nunca irá gerar excedente.


Sabe aquela geração mensal onde sempre nos meses de maior irradiância sobrariam alguns créditos para serem utilizados nos meses de menor irradiância? Pois é, talvez seja necessário rever a real necessidade de gerar esses créditos.


A terceira dica de solução é: otimizar o autoconsumo. Sabe aquelas tarefas que você pode programar um horário para serem realizadas como ligar uma máquina lava roupas, ligar um ferro de passar roupas, ligar o boiler elétrico para aquecer água, ligar o sistema de filtragem da piscina, etc? E se você pudesse ligar esses equipamentos exatamente nos momentos de geração excedente para evitar injeção na rede?


Existem sistemas fotovoltaicos que estão preparados exatamente para isso. Nesses casos, antes de limitar a geração do inversor, o sistema FV pode verificar a disponibilidade de utilizar esse excedente de energia no acionamento de alguma carga. E se não existe injeção de energia na rede, não haverá taxação.


A quarta dica de solução é: limitar a injeção de energia na rede com a função Zero Export. Essa solução inclusive pode ser utilizada junto com as outras soluções dadas.


Observe que quase todas essas soluções só funcionam com o conhecimento do autoconsumo, e isto só é possível através da instalação de um medidor inteligente para acompanhar em tempo real o perfil de consumo da unidade. É muito importante monitorar esse perfil de consumo, seja para aplicar estratégias de eficiência energética ou para uma eventual reeducação e mudança de rotinas no uso da energia elétrica.


Conclusão


Existem soluções para escapar das mudanças da Lei 14.300 e fugir da taxação.


  1. Armazenar energia excedente utilizando um sistema FV conectado à rede elétrica com armazenamento de energia;

  2. Dimensionar um sistema de modo a não gerar energia excedente;

  3. Otimizar o autoconsumo;

  4. Limitar a injeção de energia na rede com a função Zero Export.


Referências


  1. Lei Nº 14.300, de 6 de janeiro de 2022, Institui o marco legal da microgeração e minigeração distribuída, o Sistema de Compensação de Energia Elétrica (SCEE) e o Programa de Energia Renovável Social (PERS); altera as Leis nºs 10.848, de 15 de março de 2004, e 9.427, de 26 de dezembro de 1996; e dá outras providências.

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